Cientistas descobrem por que comer fibras faz bem à saúde
Uma dieta de alimentos ricos em fibras, como frutas e
legumes, reduz o risco de desenvolver diabetes, doenças cardíacas e artrite. De
fato, as evidências de seus benefícios vão além de qualquer doença em
particular: aqueles que as consomem mais simplesmente têm menor probabilidade
de morrer.
É por isso que os especialistas sempre dizem que uma dieta
que inclua muitas fibras faz bem. Porém, mesmo que os benefícios sejam óbvios,
o que não está claro é o motivo disso. "É uma pergunta fácil de fazer e
difícil de responder", disse Fredrik
Bäckhed, biólogo da Universidade de
Gotemburgo, na Suécia.
Ele e outros cientistas estão conduzindo testes que começam
a dar algumas pistas importantes sobre o papel das fibras na saúde humana – e a
pesquisa indica que muitos dos benefícios gerados não ocorrem diretamente ao
nosso corpo.
Na verdade, elas alimentam bilhões de bactérias em nosso intestino; mantê-las satisfeitas significa que o intestino e o sistema imunológico permanecem em bom estado de funcionamento.
Para digerir os alimentos, é preciso banhá-los em enzimas
que quebrarão suas moléculas; esses fragmentos moleculares atravessam então a
parede do intestino e são absorvidos.
Mas nosso corpo produz uma gama limitada, por isso não
conseguimos quebrar muitos dos compostos duros das plantas. O termo "fibra
alimentar" refere-se a essas moléculas não digeridas.
Mas só nós não as digerimos. O intestino é revestido por uma
camada de muco, e sobre ela há centenas de espécies de bactérias que são parte
do microbioma humano. Alguns desses micróbios carregam as enzimas necessárias
para quebrar vários tipos de fibras alimentares.
A capacidade dessas bactérias de sobreviver de fibras que
não digerimos levou muitos especialistas a se perguntarem se elas estão de
alguma forma envolvidas nos benefícios da dieta de frutas e folhas. Dois
estudos publicados recentemente no periódico Cell Host and Microbe fornecem evidências convincentes de que a
resposta é sim.
Experimento com ratos
Em um experimento, Andrew
T. Gewirtz, da Universidade Estadual
da Geórgia, e seus colegas colocaram camundongos em uma dieta pobre em
fibras e com alto teor de gordura. Ao examinar fragmentos do DNA bacteriano nas
fezes desses animais, os cientistas puderam estimar o tamanho da população
bacteriana no intestino de cada ratinho.
Em uma dieta pobre em fibras, eles descobriram, essa
população diminuiu cerca de dez vezes.
Bäckhed e seus colegas realizaram um experimento semelhante,
examinando o microbioma de camundongos que tiveram a alimentação alterada, indo
de alimentos ricos para os pobres em fibras. "É basicamente o que você
encontra no McDonald's, muita
gordura, muito açúcar e vinte por cento de proteína", disse Bäckhed.
Os cientistas focaram na diversidade das espécies que
compõem o microbioma intestinal dos ratos e descobriram que a mudança da dieta
teve um efeito dramático: muitas dessas espécies comuns se tornaram raras, e as
raras se tornaram comuns.
Além da mudança do microbioma, as duas equipes também
observaram alterações nos próprios ratos: o intestino diminuiu e a camada de
muco ficou mais fina. Como resultado, as bactérias acabaram ficando muito mais
próximas da parede intestinal, e essa invasão desencadeou uma reação imune.
Depois de alguns dias da dieta de baixo teor de fibras, o
intestino dos animais desenvolveu uma inflamação crônica. Após algumas semanas,
a equipe de Gewirtz observou que os ratinhos começaram a mudar de outras
formas, engordando, por exemplo, e desenvolvendo níveis mais elevados de açúcar
no sangue.
Bäckhed e seus colegas também alimentaram outro grupo de
roedores com uma dieta de alto teor de gordura, junto com uma dose modesta de
um tipo de fibra chamada inulina. Os cientistas descobriram que a camada de
muco do intestino era mais saudável do que a dos ratos que não consumiam
fibras, e as bactérias do microbioma se mantiveram a uma distância segura da
parede intestinal.
Gewirtz e seus colegas também deram inulina a suas cobaias,
mas em uma dose muito maior. As melhoras foram ainda mais dramáticas: apesar de
uma dieta com alto teor de gordura, os ratos tinham populações saudáveis de
bactérias, com o intestino mais próximo do normal, e eles ganharam menos peso.
Bäckhed e seus colegas fizeram uma experiência mais
interessante: incluíram na água dada aos animais na dieta de alto teor de
gordura uma espécie de bactéria que se alimenta de fibras. Essa alteração
melhorou o estado dos ratos: mesmo na dieta com alto teor de gordura, eles
produziram mais muco em suas entranhas, criando uma barreira saudável para
manter as bactérias afastadas das paredes intestinais.
Uma das maneiras pelas quais as fibras beneficiam a saúde é
nos dando, indiretamente, outra fonte de alimento, segundo Gewirtz.
Uma vez que as bactérias estão abastecidas de energia das fibras alimentares, elas liberam fragmentos como resíduo, sob a forma de ácidos graxos de cadeia curta, que é absorvido pelas células intestinais e usado como combustível.
Mas os micróbios do intestino produzem mais do que apenas
energia; eles também enviam mensagens.
"As células intestinais dependem de sinais químicos da
bactéria para funcionar corretamente. E respondem a eles se multiplicando e
produzindo um suprimento saudável de muco, além de liberar moléculas que matam
bactérias", disse Gewirtz.
Com isso, as bactérias do intestino ajudam a manter sua
coexistência pacífica com o sistema imunológico. Elas repousam sobre a camada
de muco do intestino a uma distância segura da parede intestinal; aquelas que
se aproximam da parede acabam dizimadas por agentes antimicrobianos.
As espécies de bactérias do intestino que se alimentam
diretamente de fibras provavelmente ajudam outras espécies que se alimentam de
seus resíduos. Várias espécies nesse ecossistema, todo ele baseado em fibras,
podem estar conversando com nosso intestino.
Os novos estudos sugerem que uma dieta pobre em fibras
perturba essa relação pacífica. As espécies que dependem delas acabam morrendo
de fome, assim como as outras espécies que dependem destas. Algumas podem
começar a se alimentar do muco do hospedeiro.
Com menos alimento, as células intestinais crescem mais
lentamente. E sem o fluxo constante de sinais químicos das bactérias, as
células diminuem a velocidade da produção de muco e de agentes antimicrobianos.
Como resultado, as bactérias se aproximam da parede
intestinal, e o sistema imunológico entra em ação.
"O intestino tem um equilíbrio tênue: precisa conter
esses organismos, mas sem exagerar. Isso pode ser o que separa a saúde da
doença", disse Eric C. Martens,
microbiologista da Universidade de
Michigan que não estava envolvido nos novos estudos.
A inflamação pode ajudar a combater infecções, mas quando se
torna crônica, pode prejudicar nosso corpo. Entre outras coisas, ela pode
interferir na maneira em que o corpo usa as calorias dos alimentos, armazenando
mais gordura, ao invés de queimá-la para obter energia.
Justin L. Sonnenburg,
biólogo da Universidade de Stanford
que não estava envolvido nos estudos, disse que uma dieta pobre em fibras pode
causar inflamação de baixo nível, não só no intestino, mas em todo o corpo.
Sua pesquisa sugere que, quando as bactérias quebram as
fibras alimentares em ácidos graxos de cadeia curta, estes vão para a corrente
sanguínea e viajam para outros órgãos, onde atuam como calmantes do sistema
imunológico.
"Você pode controlar o que está acontecendo em seu
pulmão com base nos alimentos que oferece a seu microbioma intestinal",
disse Sonnenburg.
Hannah D. Holscher,
cientista de nutrição da Universidade de
Illinois que não estava envolvida nos estudos, disse que os resultados em
ratos precisam ser postos à prova em seres humanos, ainda que seja muito mais
difícil conduzir esse tipo de estudo em pessoas.
Em seu laboratório, Holscher age como chef 24 horas por dia.
Ela e seus colegas fornecem a voluntários todas as refeições durante duas
semanas. Então, dão a alguns deles uma fonte extra de fibra – como nozes – e
verificam se há mudanças em seu microbioma e em seus níveis de inflamação.
Holscher e outros pesquisadores esperam aprender mais sobre
a maneira em que as fibras influenciam o microbioma e usá-la como uma forma de
tratar doenças. Reduzir inflamações com a ingestão de fibras também pode ajudar
no tratamento de distúrbios imunológicos, como a doença inflamatória
intestinal.
As fibras também podem ajudar a reverter a obesidade. No mês
passado, no periódico American Journal
of Clinical Nutrition, Holscher e seus colegas revisaram uma série de ensaios
em que as fibras foram usadas para tratar a obesidade – e descobriram que os
suplementos de fibra ajudaram as pessoas obesas a perder, em média, 5 quilos.
Mas, para aqueles que querem se manter saudáveis,
simplesmente adicionar um tipo de fibra à dieta ocidental típica não vai
resolver o problema; a inulina dada aos camundongos nos novos estudos apenas
restaurou parcialmente sua saúde.
Isso provavelmente ocorre porque dependemos dos diferentes
tipos de fibra dietética que obtemos de plantas. É possível que cada um deles
seja consumido por um conjunto específico de bactérias, que enviam seus
próprios sinais ao nosso corpo.
Bäckhed conclui:
É aquela coisa chata que todos nós sabemos, mas que ninguém faz. Se você comer mais folhas verdes e menos batata frita e doces, provavelmente vai se sentir melhor em longo prazo".
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