Pai consegue licença de 180 dias para cuidar das filhas recém-nascidas
Paulo Renato Vieira
Castro, 32, conquistou na Justiça uma oportunidade única: ele teve
reconhecido o direito de tirar uma licença-paternidade de 180 dias para cuidar
de Alice e Luísa, suas filhas gêmeas recém-nascidas.
Castro, que é advogado e servidor do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de Santa Catarina, conta que a
licença foi fundamental para que ele pudesse se dedicar integralmente ao
bem-estar das filhas junto da mulher, Talita
Santana Pereira, 27.
''Me deu uma oportunidade muito grande de poder
acompanhar o crescimento delas. Acho que fez toda a diferença'', afirma.
Hoje, no Brasil, homens têm direito a uma licença-paternidade
de 5 ou 20 dias – neste último caso, só se a empresa onde trabalhem esteja
vinculada ao Programa Empresa Cidadã,
do governo. As mulheres, por outro lado, têm direito a uma licença-maternidade
de 120 a 180 dias.
''Se fosse apenas o período de 20 dias, não seria
suficiente'', defende Castro. As gêmeas, que hoje têm quase 10 meses de
idade, têm uma relação bastante próxima com o pai.
''Desde pequenas elas ficam comigo sozinhas. Sei tudo o
que elas precisam, sei todas as necessidades delas. A minha ideia não era
apenas ajudar a minha esposa, porque a função do pai não é só ajudar. Minha
ideia era ser pai de verdade'', explica.
Decisão inédita
A decisão do Juizado Especial de Santa Catarina é inédita no
país para o caso de nascimento de múltiplos. Apesar de o pedido liminar ter
sido negado a princípio, a sentença foi favorável à extensão do benefício.
''Eu fundamentei no nosso pedido que na própria Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)
existe a previsão de que um pai solteiro que adota uma criança tem direito a
licença igual à maternidade, com o mesmo período de tempo'', conta Castro.
Em sua sentença, a juíza da 1ª Vara Federal de Florianópolis
Simone Barbisan Fortes destaca
também o direito da criança à proteção integral. ''Friso que, no caso de
múltiplos, uma só pessoa – ainda que a mãe – não conseguirá atender às duas
crianças da mesma forma como se assegura o direito para uma só e com a proteção
integral garantida pelo constituinte'', afirma.
A União recorreu da decisão, mas teve o pedido negado.
Sistema 'arcaico'
Para Castro, o sistema brasileiro de licenças é ''engessado e arcaico'' e perpetua uma ideia ultrapassada.
''O sistema de licenças, como ele é hoje, deixa ao pai a
função de prover apenas materialmente. É um resquício de uma sociedade em que a
mãe teria que cuidar da criança, não importando se ela trabalha ou não, e o pai
teria que contribuir só com dinheiro e comida'', argumenta.
Para ele, ''o papel do pai tem que ser revisto''. ''O pai tem que ter não só responsabilidade material, mas também
responsabilidade afetiva'', diz.
Apesar de ter sido muito criticado por pessoas que, segundo
ele, afirmaram que Castro ''queria 180 dias para ficar à toa'' e
questionaram ''quem pagaria essa conta'' – já que, por ser servidor, o
Estado arcou com os custos da sua licença – ele espera que essa decisão da
Justiça influencie outros casos semelhantes ao seu.
''Eu pago [essa conta] há muito tempo, pago
imposto justamente para isso. Além disso, a questão é trazer para o centro da
discussão a importância do pai para o desenvolvimento dos filhos e qual seria a
solução para equacionarmos [a diferença entre as licenças para pais e mães].
Como vamos fazer? Vamos ter licença igual? Como vamos lidar com isso?'',
questiona.